Poesias sobre cartas de amor

Organizei esta seleção de poesias que falam sobre cartas de amor. Aproveita!
Fernando Pessoa (1888 - 1935)
- Fernando António Nogueira Pessoa foi um poeta, filósofo, dramaturgo, ensaísta, tradutor, publicitário, astrólogo, inventor, empresário, correspondente comercial, crítico literário e comentarista político português.
- Os heterônimos de Fernando Pessoa são criações que fascinam leitores no mundo inteiro. O autor português, nascido em 1888, tinha vários heterônimos, isto é, autores fictícios que assinam algumas de suas obras. Cada um deles tem características pessoais e literárias próprias.
- Nas publicações realizadas durante sua vida, Fernando Pessoa assinou apenas uma obra em língua portuguesa, o livro Mensagem, publicado em 1934, um ano antes do falecimento do autor."

Todas as cartas de amor são ridículas - Álvaro de Campos (Heterônimo
Todas as cartas de amor são
Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.
Também escrevi em meu tempo cartas de amor,
Como as outras,
Ridículas.
As cartas de amor, se há amor,
Têm de ser
Ridículas.
Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.
Quem me dera no tempo em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.
A verdade é que hoje
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas.
(Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas.)
Manoel Bandeira (1886 - 1968)
- Manuel Carneiro de Sousa Bandeira Filho foi um poeta, crítico literário e de arte, professor de literatura e tradutor brasileiro. É considerado como parte da geração de 1922 do modernismo no Brasil.

Cartas de meu avô
A tarde cai, por demais
Erma, úmida e silente…
A chuva, em gotas glaciais,
Chora monotonamente.
E enquanto anoitece, vou
Lendo, sossegado e só,
As cartas que meu avô
Escrevia a minha avó.
Enternecido sorrio
Do fervor desses carinhos:
É que os conheci velhinhos,
Quando o fogo era já frio.
Cartas de antes do noivado…
Cartas de amor que começa,
Inquieto, maravilhado,
E sem saber o que peça.
Temendo a cada momento
Ofendê-la, desgostá-la,
Quer ler em seu pensamento
E balbucia, não fala…
A mão pálida tremia
Contando o seu grande bem.
Mas, como o dele, batia
Dela o coração também.
A paixão, medrosa dantes,
Cresceu, dominou-o todo.
E as confissões hesitantes
Mudaram logo de modo.
Depois o espinho do ciúme…
A dor… a visão da morte…
Mas, calmado o vento, o lume
Brilhou, mais puro e mais forte.
E eu bendigo, envergonhado,
esse amor, avô do meu…
Do meu – fruto sem cuidado
Que inda verde apodreceu.
O meu semblante está enxuto.
Mas a alma, em gotas mansas,
Chora, abismada no luto
Das minhas desesperanças…
E a noite vem, por demais
Erma, úmida e silente…
A chuva em pingos glaciais,
Cai melancolicamente.
E enquanto anoitece, vou
lendo, sossegado e só,
As cartas que meu avô
Escrevia a minha avó.
Joan Margarit (1938 - 2021)
- Joan Margarit i Consarnau foi um poeta, arquiteto e catedrático da Universidade Politècnica de Catalunya. Recebeu o Prêmio Miguel de Cervantes em 2019.

Não jogues fora as cartas de amor!
Elas não te abandonarão.
O tempo passará, apagar-se-á o desejo
— esta flecha da sombra —
e os rostos sensuais, belos e inteligentes,
ocultar-se-ão em ti, no fundo de um espelho.
Passarão os anos. Cansar-te-ão os livros.
Decairás ainda mais
e perderás até mesmo a poesia.
O ruído da cidade nas vidraças
acabará por ser tua única música,
e as cartas de amor que houveres guardado
serão tua última literatura.